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[coluna] Lockdown e a divisão social – por André Romero

A pandemia da Covid-19 escancarou inúmeros cenários já caoticamente existentes em nossa sociedade, entre diversos pontos, chamo a atenção para o movimento de conflito mais recente, Brasil a fora e também no estado do Amapá: o comportamento social perante ao Lockdown.

O tão falado embate entre vida e economia não é novidade na nossa cultura, e as pessoas precisam e devem se permitir enxergar esta realidade na qual o necroestado efetiva, de que há vidas matáveis e outras não, há bastante tempo, através de várias formas que decorrem da necropolítica à brasileira. Uma sociedade atacada por desmontes de políticas públicas em diversos segmentos, via governo federal, sente no dia a dia as consequências e o básico já se tornou custoso demais em nosso país.

Com uma das maiores taxas de desassistência social e de desemprego, o sujeito brasileiro já vem de um movimento de estar pré(ocupado) com a conquista do básico, e isso antecede o coronavírus. Vírus este que vem para nos jogar na cara o quanto o brasileiro é facilmente manipulável, já que o próprio estado que concretiza esse descaso público, é o mesmo que diante de uma das maiores barbáries da saúde do país, adota a posição mais esperada, a sua ‘desresponsabilização’.

Quando um sujeito busca atendimento clínico, atrás de ajuda, orientação e às vezes de algo que nem ele mesmo sabe o que, aos poucos o movimento da terapia leva esse sujeito para a responsabilidade perante às suas próprias queixas e a possibilidade de enxergar o quanto se terceiriza para os outros essa responsabilidade. A grosso modo, é doloroso assumir as próprias demandas e desejos. Vamos pegar essa dinâmica de entendimento, esta verdade, e colocar para o âmbito social, este mesmo sujeito, se chama Estado.

O estado terceiriza a sua responsabilidade para os outros, para a grande massa, para uma sociedade que inclusive assume esse investimento e ataca a si mesma. Outra consequência explícita da necropolítica é o óbvio desinvestimento na educação pública, já que a educação é a maior arma contra o fascismo, contra movimentos opressores e contra a violência em todas as suas manifestações.

Isso fica ainda mais nítido quando a nossa cultura se depara com um vírus, desconhecido (inicialmente), inesperado e invisível, e essa população em termos de conhecimento e de saúde mental fica como? Expondo todo esse não investimento.

Estamos atacando e tentando culpar as pessoas erradas, pois a quem foi legitimado para representar e garantir os direitos de toda uma sociedade, está claramente, negando esse papel. A briga não é com o vizinho que não concorda com o lockdown pois quer ganhar o pão, a briga não é com o parente que é favor do fechamento evidenciando a proteção à saúde. Devemos e necessitamos entender uma coisa, QUALQUER demanda pública, é DEVER do estado, e DIREITO nosso. As necessidades enfrentadas que estão gerando todo esse caos conflituoso são obrigação do estado, assim como a garantia de segurança econômica e acesso à saúde de qualidade.

Talvez seja utópico, ao menos diante da nossa realidade atual, falar em união de lados distintos, porém o básico que deveria ser feito que é a união para cobrar o direito de todos, daqueles que detém a governança pública, e não focar somente na intriga de quem apoia governadores ou presidência. Porém, jamais podemos deixar de evidenciar que o “maior” líder desta nação, literalmente do primeiro dia ao agora, apenas terceirizou a responsabilidade que o compete.

Vida e economia são base, assim como há muitas outras bases, contudo, não estão cobrando a garantia dessas, do principal responsável. Talvez você possa se permitir a não resistir a assumir essas verdades e mudar a sua visão e opinião, pois se tem algo maior do que o nosso frágil narcisismo, é o interesse público e a saúde de todos.


 

Perfil

André Romero é Psicólogo (CRP: 10/05733), professor e palestrante. Defensor das causas sociais de saúde pública, assina a coluna de saúde mental no portal Café com Notícia.

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