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Artigo revela que os indígenas foram mais infectados pela COVID-19 e tiveram menor cobertura vacinal enquanto grupo prioritário

Foto: Iepé

A falta de uma estratégia coordenada de prevenção levou a mortes evitáveis pela COVID-19 entre os povos indígenas no Brasil, como mostra artigo publicado na revista The Lancet Regional Health – Americas

Um artigo publicado na revista The Lancet Regional Health – Americas revela que, considerando o denominador populacional, os povos indígenas foram proporcionalmente mais infectados do que a população em geral pelo novo coronavírus. Essa diferença foi atenuada com a chegada da vacina, mas continuou presente.

A autoria do artigo é de Fernanda Christina Gomes Machado e suas colegas Maria Tereza da Matta Barddal e Laura Alves Nascimento, orientadas pelas médicas e professoras da Faculdade Israelita de Ciências da Saúde Albert Einstein, Mariana Maleronka Ferron e Vivian Avelino-Silva e, também, pela antropóloga Juliana Rosalen, coordenadora do Programa Wajãpi do Iepé – Instituto de Pesquisa e Formação Indígena.

A partir de dados do Ministério da Saúde de março de 2020 a dezembro de 2021, as pesquisadoras analisaram a incidência e mortalidade por COVID-19 e a cobertura vacinal entre os povos indígenas do Brasil em comparação com outros grupos prioritários e com a população geral.

O artigo destaca que, dentre os grupos priorizados na estratégia de vacinação, os povos indígenas tiveram menor cobertura vacinal quando comparados com pessoas idosas, exceto aquelas acima de 90 anos (gráfico 1).

Gráfico 1 – Cobertura vacinal de povos indígenas comparada à cobertura de pessoas idosas da população geral

Foram observadas diferenças importantes na cobertura vacinal entre os vários Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs). Em dezembro de 2021, os DSEIs Alto Rio Negro (AM), Parintins (AM), Altamira (PA) e Vilhena (RO) apresentaram uma cobertura de 90% de alcance. Já os DSEIs Kaiapó (PA) e Rio Tapajós (PA) tiveram cobertura abaixo de 50% para a segunda dose ou dose única da vacina. Segundo o artigo, essas diferenças indicam falhas relevantes quanto ao planejamento e implementação da vacinação contra a COVID-19.

Doutora Vivian Avelino-Silva fazendo testes de Covid com povos wajãpi . Foto_ Iepé

A baixa cobertura foi maior nos DSEIs localizados nas regiões Norte e Centro-Oeste, potencialmente refletindo desafios na vacinação de populações que vivem em comunidades de difícil acesso.

“Embora as dificuldades de acesso desafiem a implementação de qualquer programa de vacinação para populações indígenas, experiências anteriores bem-sucedidas sugerem que faltou planejamento e campanhas específicas, que poderiam ajudar a combater as fake news e incentivar a vacinação contra a COVID-19 entre os povos indígenas”, pontua Maleronka.

A ausência de uma estratégia coordenada para reforçar a importância da vacina e outros métodos de prevenção e a escassez de informações confiáveis e de recursos para atender essa situação extrema de saúde resultaram em menor cobertura vacinal, maiores taxas de incidência e mortes evitáveis por COVID-19 entre os povos indígenas no Brasil.

“Frente a essa situação de extrema vulnerabilidade, os idosos foram bastante atingidos. E como os povos indígenas costumam enfatizar, a perda destes conhecedores acaba ameaçando conjuntos de saberes, que são transmitidos de geração em geração”, ressalta Rosalen. Sobre a baixa vacinação – As dificuldades de acesso são desafios tanto para o programa de vacinação, quanto para a assistência à saúde, quando necessária. Apesar de todas essas dificuldades, o Programa Brasileiro de Imunizações já havia

alcançado, no passado, alta cobertura vacinal para outras doenças entre os povos indígenas. Por exemplo, durante a pandemia de H1N1, quase 90% da população indígena foi vacinada em um curso de três meses, sugerindo que o isolamento geográfico por si só não pode justificar os resultados observados durante a pandemia de COVID-19 nessa população.

Doutora Vivian Avelino-Silva atendendo os povos wajãpi. Foto_ Iepé

A médica Vivian Avelino-Silva ressalta que o programa de vacinação da COVID-19 no Brasil ocorreu sem a implementação de uma estratégia coordenada de informações que pudesse incentivar a adesão à vacina. “Os brasileiros receberam informações conflitantes e imprecisas do próprio presidente da República. Simultaneamente, como visto em outras partes do mundo, um fluxo de notícias falsas sobre a segurança e a eficácia da vacina invadiu o território indígena, principalmente por meio do boca a boca e pelas redes sociais”, afirmou Avelino-Silva.

Outros dados levantados – O programa brasileiro de vacinação contra a COVID-19 começou em janeiro de 2021 e incluiu populações indígenas acima de 18 anos entre os grupos prioritários. A cobertura vacinal geral indígena foi de 73% para a primeira dose e 55% para a segunda em março de 2021, e aumentou para 90% para a primeira dose e 85% para a segunda em dezembro de 2021.

Gráfico 2 – Cobertura vacinal geral indígena

Outros dados observados foram as taxas de incidência cumulativa de 2021 por 100.000 habitantes entre a população indígena e a população brasileira em geral. A incidência relatada de COVID-19 foi maior entre os grupos indígenas, apesar da priorização no programa de vacinação, sugerindo que as intervenções não farmacológicas para prevenir a disseminação do COVID-19 foram implementadas de forma menos eficiente e insuficiente nessas populações.

Gráfico 3 – Taxas de incidência cumulativa por 100.000 habitantes entre a população indígena e a população brasileira em geral

Como anda a vacinação no DSEI Amapá e Norte do Pará? Segundo dados recentes do DSEI AMP, a cobertura vacinal para a segunda dose ou dose única da vacina ficou estacionada, entre setembro e dezembro de 2021, em 82%. Em alguns polos-base, a vacinação continua baixa. Na aldeia Kumenê, por exemplo, localizada no município de Oiapoque (AP), apenas 58,5% dos adultos tomaram a primeira dose até o momento e 52% tomaram a segunda. Os dados mostram também que as doses de reforço e a vacinação entre adolescentes e crianças continuam muito baixas. No polo-base Kumarumã, 90% dos adolescentes tomaram a primeira dose, mas apenas 47% tomaram a segunda. (Fonte: Distrito Sanitário Especial Indígena Amapá e Norte do Pará).
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