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[FORA DA GREI]Para que servem os filhos? – Os desafios da hiperparentalidade

Se você pudesse perguntar para qualquer aldeão da Idade Média para que servem os filhos, a resposta provavelmente seria: “Para ajudar no sustento da família”. Se a mesma pergunte fosse feita para alguém mais moderno – um cidadão comum de alguma grande cidade no século XIX – este alguém certamente diria: “Para dar continuidade ao meu nome”. Finalmente, se fizermos a tal pergunta para grande parte de pais e mães do século XXI, certamente, ouviremos coisas do tipo: “Filhos servem para nos trazer felicidade”. “As crianças precisam ser felizes a todo custo”. “Filhos servem para receber todo o nosso amor e carinho”; etc.


Até meados do século XVIII, crianças eram vistas como adultos em miniatura e, portanto, assim que cresciam o suficiente tinham como obrigação principal ajudar a família em sua atividade econômica, principalmente no campo. A partir do século XIX, com a chegada da modernidade e a consolidação de uma visão de mundo romântica (inspirada nos exageros afetivos do movimento artístico-cultural chamado romantismo), as crianças passam a ser vistas como “as verdadeiras sementes do futuro”, bastando regá-las com amor e atenção para que descem bons frutos aos pais, quando estes chegassem à velhice.


No entanto, a partir da metade do século XX, no período após a Segunda Guerra e durante toda a chamada Guerra Fria, muito em consequência da hegemonia do capitalismo norte-americano, a visão dos pais em relação aos filhos mudou e estes passaram a ser vistos como pessoas que precisam ser mantidas afastadas de todo e qualquer sofrimento ou trauma. A criança não pode mais trabalhar. Sua única obrigação é estudar e se preparar ao máximo para ter um futuro brilhante. Assim, todo o sacrifício (investimento financeiro, principalmente) feito pelos pais durante todo o desenvolvimento da criança, deverá ser recompensado um dia quando esse menino ou essa menina que já deverá saber falar, até os quatro anos de idade, pelo menos a sua língua nativa e o inglês; até os sete já deve saber manusear com precisão qualquer dispositivo eletrônico e, até os 21 já deverá ter, no mínimo um MBA feito em alguma grande universidade dos Estados Unidos ou Europa, chegar à idade adulta.


Logicamente estou falando das famílias privilegiadas economicamente pois, as famílias mais pobres ainda vivem de certa forma na Idade Média.

Mas voltando a falar diretamente com você que foi alfabetizado; tem acesso à internet para ler esse texto em um dispositivo qualquer e é ou vai ser pai/mãe e não sabe por onde começar, o meu conselho de amigo é: Não seja um superpai ou uma supermãe, pois isto é algo altamente prejudicial para o desenvolvimento dos seus filhos.


Vemos alguns pais preocupados, outros muito estressados, outros que se afastam da educação de seus filhos e delegam esta tarefa aos meios de comunicação, à escola ou, se houver possibilidade, às babás. A verdade é que as diretrizes que a educação mais tradicional tinha foram colocadas em questão, e isso deu lugar a uma gama muito ampla de modelos educativos que, em muitos casos, tem muita confusão como resultado. Entre as consequências dessa confusão, encontramos a hiperparentalidade.


A hiperparentalidade nasce como a perversão de um modelo educativo no qual se defende que é necessário aumentar a atenção e o cuidado que os pais dedicam aos seus filhos. Inclui aqueles pais que protegem seus filhos em excesso, lhes dão muita atenção e mimam acima do necessário, sem saber que estão limitando sua independência, sua liberdade e o desenvolvimento de sua autonomia.


Os hiperpais velam pelo êxito acadêmico de seus filhos e sofrem por cada possível frustração que possa acontecer com eles. Assim, longe de lhes fazer bem, criam filhos superestimulados, superprotegidos e inseguros.


A hiperparentalidade é a consequência de um modelo educativo habitual nas sociedades mais acomodadas, onde a ânsia competitiva impera, transportada para a esfera da parentalidade. Os pais se veem imersos de cabeça em uma carreira cuja meta é fazer com que seu filho triunfe na vida. Reservam uma vaga na melhor escola infantil (antes que a criança nasça), o melhor colégio, universidade de elite, etc.


Isso inclui uma estimulação precoce, com um excesso de atividades extracurriculares e uma agenda sem espaços em branco. Além disso, contém uma baixa ou nula tolerância à frustração e enfrentamentos com os professores que ousem questionar as maravilhas de seus filhos. Também é comum a atitude de mimá-los com objetos de todo tipo, como livros, dispositivos eletrônicos, jogos, etc.


A perversão deste modelo de criação, no qual reclama-se mais atenção para as crianças, está baseada em uma constante atenção e em expectativas desmedidas para que os filhos façam, estudem, tenham ou alcancem. Definitivamente, não é o melhor para um saudável desenvolvimento psicoemocional para as crianças.


A hiperparentalidade é exaustiva para os filhos porque implica agendas frenéticas e para os pais porque são eles quem os levam de uma atividade para outra, falam com seus professores com frequência, supervisionam suas tarefas de casa e as fazem com eles, planejam suas agendas, inclusive suas amizades.


Estou falando de pais com um nível de estresse muito alto, de filhos muito estressados também.
Os filhos desenvolvem um alto nível de autoexigência e uma baixa tolerância à frustração. Não é permitido que falhem e é exigida deles uma necessidade de superação constante.


Por outro lado, alguns pais mostram sua insegurança. Há uma super-oferta de métodos e experiências que a criança precisa viver e isso supõe um estresse do qual não é possível fugir. Os pais têm dúvidas sobre o que é melhor para seus filhos e passam a vida procurando mimá-los com experiências, oportunidades e metodologias, assim como com outras coisas materiais e novas tecnologias.


O que fazer então?
A primeira coisa é relaxar e sair da espiral. Como pais, podemos respirar e relaxar. As crianças não precisam de pais perfeitos, precisam de pais tranquilos. Reduzir a agenda dos filhos supõe reduzir a dos pais.
Os pais precisam deixar que as crianças brinquem, para que aprendam a se entreter e lidar com seu tempo. A brincadeira é vital no desenvolvimento e, com tanta atividade e estresse, a criança não tem tempo para brincar, se entediar e aprender.


Os pais precisam aprender a confiar em si mesmos e em seus filhos, soltar um pouco de suas mãos, exigir menos, se deixar levar pela intuição e acompanhar seu desenvolvimento. Reforçar positivamente, parabenizá-los pelas suas conquistas e se emocionar, para que as crianças se apaixonem pela vida e aprendam a viver diariamente, a se relacionar com os outros e a lidar com suas emoções.

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Silvio Carneiro

Silvio Carneiro Bastos Neto é graduado em Jornalismo (UEPB). Possui formação em Psicanálise Clínica (IBPC; Campinas-SP) e Terapias Holística (Instituto 3ª Visão; Garibaldi-RS). Possui pós-graduação em Psicologia Positiva (PUCRS; Porto Alegre-RS) e Docência do Ensino Superior (Meta; Macapá-AP). Contatos: (96) 98132-2705 (Whatsapp)

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